Um dia, o rei Artur estava caçando um grande veado branco nas cercanias do
bosque de carvalhos quando ergueu os olhos e se viu confrontado por um chefe
guerreiro alto forte, brandindo a espada e dando a impressão de que ia abater o
rei ali mesmo. Este homem era Groiner, que disse estar querendo vingar-se pela
perda de parte de suas terras ao norte para Artur. Como Artur estava desarmado,
Sir Gromer demonstrou compaixão e deu ao rei uma chance de salvar sua
vida.
Gromer lançou um desafio: o rei tinha um ano para voltar desarmado àquele
lugar com a resposta para a pergunta: O que as mulheres desejam acima de
tudo?
Se Artur respondesse à pergunta corretamente, sua vida seria poupada; caso
contrário, sua cabeça seria cortada.
Quase um ano se passou e Artur e Gawain reuniram muitas respostas, mas
nenhuma soava verdadeira. O dia marcado estava se aproximando, e numa manhã
Artur saiu cavalgando sozinho no meio das urzes roxas e dos tojos dourados,
totalmente absorto em seus problemas. Ao aproximar-se do bosque de carvalhos,
viu-se subitamente diante de uma mulher grande e grotesca, coberta de verrugas e
quase tão larga quanto alta.
Os olhos dela o contemplaram destemidamente e ela declarou:
— O senhor é Artur, o rei, e dentro de dois dias terá que se encontrar com
Sir Gromer com uma resposta para uma pergunta.
— É verdade — respondeu Artur hesitante —, mas como é que sabe
disso?
— Eu sou Lady Ragnell e Sir Gromer é meu meio-irmão. O senhor não sabe a
resposta certa, sabe?
— Tenho muitas respostas, e não sei o que a senhora tem a ver com isto —
respondeu Artur, puxando as rédeas para se virar e voltar para casa.
— O senhor não sabe a resposta certa — disse Ragnell com uma confiança que
deixou Artur desanimado. — Eu tenho a resposta.
Artur virou-se e saltou do cavalo.
— Diga-me a resposta e eu lhe darei um saco cheio de ouro.
— Não preciso de seu ouro - respondeu Ragnell calmamente.
— Bobagem, mulher, você poderá comprar o que quiser com ele! O que você
quer, então? Jóias? Terras? O que quiser eu pagarei. Isto é, se você souber a
resposta certa.
— Eu sei a resposta. Isto eu posso garantir — respondeu Ragnell. Após uma
pequena pausa, ela acrescentou: — Em troca, exijo que Sir Gawain se torne meu
marido.
Artur abriu a boca de espanto.
— Impossível! — gritou. — Você pede o impossível, mulher. Eu não posso
dar-lhe o meu sobrinho. Ele é dono de si mesmo, não pertence a mim para que eu o
dê.
— Eu não pedi ao senhor que me desse o cavaleiro Gawain. Se Gawain
concordar em se casar comigo por livre e espontânea vontade, então eu lhe direi
a resposta. São estas as minhas condições.
— Condições! Que direito você tem de estabelecer condições para mim é
impossível! Eu jamais poderia apresentar esta proposta para ele.
Ragnell ficou olhando calmamente para o rei e disse apenas:
— Se mudar de idéia, estarei aqui amanhã. — E desapareceu no
bosque.
Abalado com aquele estranho encontro, Artur cavalgou lentamente de volta
para casa pensando consigo mesmo que jamais poderia falar daquele assunto com
Gawain. Aquela mulher repugnante! Como ousava pedir para se casar com o melhor
dos cavaleiros! Mas o ar da tarde estava ameno e o encontro fatídico com Gromer
deixou Artur impressionado. Ao retornar ao castelo, Artur viu-se contando ao
sobrinho sobre sua aventura, e concluiu:
— Ela sabe a resposta, eu tenho certeza disso, mas eu não pretendia contar
nada a você.
Gawain sorriu docemente, sem saber ainda qual era a proposta de
Ragnell.
— Mas esta é uma boa notícia, tio. Por que o senhor está tão
desanimado?
Evitando encarar o sobrinho, o rei contou qual era a exigência de Ragnell,
junto com uma descrição detalhada de seu rosto grotesco, de sua pele cheia de
verrugas e seu tamanho avantajado.
— Que bom que eu posso salvar a sua vida! — respondeu Gawain imediatamente.
Sem dar ouvidos aos protestos do tio, Gawain declarou: — É minha escolha e minha
decisão. Vou voltar lá com o senhor amanhã e concordar com o casamento, desde
que a resposta dela salve a sua vida.
Bem cedo na manhã seguinte Gawain saiu a cavalo com Artur para encontrar
Lady Ragnell. Mesmo vendo-a cara a cara, Gawain manteve-se inabalável em sua
decisão. A proposta dela foi aceita e Gawain fez uma reverência graciosa para
ela.
— Se amanhã a sua resposta salvar a vida do rei, nós nos
casaremos.
Na manhã fatídica, Gawain cavalgou até metade do caminho com Artur, que
assegurou ao cavaleiro que iria tentar todas as outras respostas primeiro. O
guerreiro alto e forte estava esperando por Artur, com sua espada brilhando ao
sol. À medida que Artur ia recitando uma resposta depois da outra, Gromer
gritava:
— Não! Não! Não! — até que finalmente ele ergueu a espada acima da
cabeça.
— Espere! — gritou o rei. — Eu tenho mais uma resposta. O que uma mulher
deseja acima de tudo é o poder de soberania, o direito de exercer o seu
livre-arbítrio.
Com uma imprecação de raiva, Gromer jogou a espada no chão.
— Você não descobriu a resposta sozinho! Minha maldita meia-irmã foi quem
lhe contou! Vou decepar a cabeça dela. Vou atravessá-la com a minha espada! —
Virou-se e voltou para a floresta, deixando uma torrente de imprecações atrás de
si.
Artur voltou para o local onde Gawain esperava junto de Lady Ragnell. Os
três cavalgaram de volta para o castelo em silêncio. Só Ragnell parecia bem
humorada. A notícia de que iria ocorrer um estranho casamento entre uma megera
horrorosa e o magnífico Gawain espalhou-se rapidamente pelo castelo. Ninguém
conseguia imaginar o que havia convencido Gawain a se casar com aquela
criatura.
Alguns achavam que ela devia possuir grandes terras e propriedades. Outros
acreditavam que ela devia ter usado alguma magia secreta. A maioria estava
simplesmente estarrecida com o destino do pobre Gawain.
O rei Artur falou reservadamente com o sobrinho.
— Nós poderíamos propor um adiamento — disse ele.
— Dei a ela a minha palavra, tio. O senhor gostaria que eu quebrasse uma
promessa? — respondeu Gawain.
Assim, o casamento aconteceu na abadia, e a estranha festa de casamento foi
assistida por toda a corte. Durante todo aquele longo dia e aquela longa noite,
Gawain permaneceu simpático e cortês. Não demonstrou nada além de uma atenção
gentil para com a sua noiva.
Finalmente, o casal se retirou para os seus aposentos.
— Você se manteve fiel à sua promessa — observou Ragnell. —Você não
demonstrou nem piedade nem repulsa para comigo. Agora que estamos casados, venha
beijar-me.
Gawain se aproximou imediatamente dela e a beijou. Quando se afastou, viu
diante de si uma linda e serena mulher, de olhos cinzentos e rosto sorridente.
Seus cabelos se eriçaram com o choque, e ele deu um pulo para trás.
— Que espécie de feitiçaria é esta? Ragnell respondeu:
— Você me prefere assim? — lentamente deu uma volta em torno
dele.
— É claro que sim, mas não compreendo — gaguejou Gawain, confuso e
assustado.
— Meu meio-irmão, Gromer, sempre me detestou. Ele aprendeu truques de
feitiçaria com a mãe dele e usou-os para me transformar numa megera
horrorosa.
Ordenou que eu vivesse com este corpo até que o melhor cavaleiro da
Bretanha me escolhesse como esposa.
— Mas por que ele a odiava tanto? - perguntou Gawain. Com um sorriso nos
lábios, Ragnell respondeu:
— Ele me achava atrevida e pouco feminina, porque eu me recusava a aceitar
as ordens dele, tanto em relação à minha propriedade quanto à minha
pessoa.
Com grande admiração, Gawain disse:
— Então você conseguiu o impossível e o feitiço dele foi
quebrado!
— Só em parte, meu querido Gawain. — Ela o encarou com firmeza. — Você pode
escolher como eu vou ser. Você quer que eu fique assim, com o meu próprio corpo,
à noite em nosso quarto? Ou me quer grotesca à noite no nosso quarto e com o meu
próprio corpo de dia no castelo? Bonita de dia ou bonita à noite, pense bem
antes de responder.
Gawain ajoelhou-se diante da noiva e respondeu imediatamente.
— Esta é uma escolha que eu não posso fazer. Diz respeito a você, minha
querida Ragnell, e só você pode escolher. O que quer que você escolha, eu a
apoiarei.
Ragnell soltou um longo suspiro. A alegria em seu rosto deixou-o
encantado.
— Você respondeu bem, meu querido Gawain. Sua resposta quebrou
completamente o feitiço de Gromer. A última condição que ele impôs foi que,
depois do casamento, o maior dos cavaleiros da Bretanha, meu marido, deveria
dar-me o poder do exercício da soberania, o direito de exercer o meu livre
arbítrio.
Só então o terrível feitiço seria quebrado para sempre.
E assim, com muito encantamento e alegria, começou o casamento de Sir
Gawain e Lady Ragnell.
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