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Era uma vez um homem que se casou com uma mulher muito cheia de dengues. Fingia
não ter apetite. Quando se sentava à mesa era para tocar apenas nos pratos.
Comia três grãos de arroz e já cruzava o talher, como se tivesse comido um boi
inteiro.
O marido
desconfiou de tanta falta de apetite, porque apesar daquele eterno jejum ela
estava bem gordinha. E imaginou uma peça.
- Mulher - disse ele -
tenho de fazer uma viagem de muitos dias. Adeus.
E partiu com a
mala às costas - mas deu jeito de voltar sem ser percebido e de esconder-se na
cozinha atrás do pilão.
Logo que se viu só em
casa, a mulher dos dengues suspirou de alívio e correu à cozinha.
- Joaquina - disse à
cozinheira - prepare-me depressa uma sopa bem grossa, que quero almoçar.
A negra preparou uma
panelada de sopa, que a dengosa engoliu até o finzinho.
Logo disse à cozinheira:
- Joaquina, mate um
frango e prepare-me um ensopado para o jantar.
A negra preparou o
ensopado, que ela comeu sem deixar uma isca.
- Agora, Joaquina,
prepare-me beijus bem fininhos para eu merendar.
E merendou os beijus ,
sem deixar um farelo.
-E agora, Joaquina,
prepare-me um prato de mandioca bem enxuta para eu cear.
A negra preparou a
mandioca, que a dengosa comeu até não poder mais.
O marido então escapou
do esconderijo e foi bater na porta da rua, fingindo estar chegando da viagem.
Era um dia de chuva bem forte.
Quando a mulher abriu e
deu com o homem, ficou desapontada. Ele explicou que havia desistido da tal
viagem e voltado.
- Maridinho, como você
voltou tão enxuto, debaixo duma chuva tão grossa?
O marido respondeu:
_ Se a chuva fosse tão
grossa como a sopa que você almoçou, eu viria tão ensopado como o frango que
você jantou; mas como era uma chuva fina como os beijus que você merendou, eu
cheguei tão enxuto como a mandioca que você ceou.
A dengosa ficou
admiradíssima daquelas palavras e desapontadíssima ao compreender que o esposo
tinha descoberto sua manha. E acabou com os dengues.
Fonte: Monteiro
Lobato em Histórias de Tia Anastácia
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