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HOJE ALGUMAS FRASES ME DEFINEM: Clarice Lispector "Os contos de fadas são assim. Uma manhã, a gente acorda. E diz: "Era só um conto de fadas"... Mas no fundo, não estamos sorrindo. Sabemos muito bem que os contos de fadas são a única verdade da vida." Antoine de Saint-Exupéry. Contando Histórias e restaurando Almas."Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos." Fernando Pessoa

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segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

A mulher curiosa



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Estava um religioso a cozinhar numa pousada suas magras viandas.
Uma mulher, que morava na vizinhança, meteu os olhos pela janelinha que lhe ficava fronteira e pouco distante, e perguntou-lhe, em tom de gracejo, se lhe faltava alguma coisa.
- Sim, falta - respondeu o santo. Alguns ladrilhos e um pouco de barro para entaipar essa janela.
As palavras do santo envolviam claramente uma censura à curiosidade importuna de sua vizinha.
Ensinam os teólogos que não devemos criticar o procedimento dos outros nas coisas que não nos dizem respeito. Temos muito que fazer em nós mesmos e em o nosso interior, sem que nos seja preciso importar-nos com o que respeita aos outros. É isto excelente remédio contra a maledicência.
Quando São Pedro teve a curiosidade de perguntar a Jesus o que acontecia a João, ouviu do Mestre esta resposta célebre: Que te importa a ti? Segue-me! Por que perguntas coisas que não te dizem respeito?
Desfrutaríamos de muita paz se não nos ocupássemos de ações e palavras que não pertencem ao nosso cuidado.
Como pode, por muito tempo, viver em paz quem se intromete nos negócios alheios, quem sai em busca de relações exteriores, e pouco ou raramente se recolhe em si mesmo?
Bem-aventurados os simples, porque gozarão de muita paz.

Fonte: Lendas do Céu de da Terra de Malba Tahan

Branca Flor




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O rei D. Carlos tinha o vício de jogar. Estava acostumado a ganhar sempre, pois os seus súditos não se atreviam a vencê-lo no jogo.
Um dia, recebeu a visita de um príncipe de outro reino e o convidou para jogar. O rapaz não sabia que o rei ficava furioso quando perdia, de modo que jogou sem se importar com o resultado. Ganhou todos os jogos.
Vendo-se derrotado, o rei ficou louco de raiva. Declarou ao príncipe que êle não sairia vivo do seu reino. E não lhe daria a mão de uma filha, pedida pelo príncipe.
O rapaz ficou muito triste e procurou um velhinho, que morava perto da floresta, do qual diziam ser um bom feiticeiro. O velho aconselhou o príncipe a ficar escondido junto de um lago, onde costumavam banhar-se as três filhas do rei. As moças eram encantadas e, por isso, se transformavam em patas, nessa ocasião.
O velho disse ao rapaz que escondesse a roupa da princesa mais jovem, quando ela se despisse. Depois do banho, a moça havia de procurar a roupa e, não a encontrando, ficaria muito aflita e prometeria toda a proteção a quem a restituísse.
O príncipe seguiu o conselho do velho, foi para junto do lago e escondeu-se. Daí a pouco, chegaram as moças. Tiraram a roupa, transformaram-se em patas e correram para o lago onde ficaram nadando.
Terminado o banho, as que encontraram a roupa, vestiram-na, voltaram à forma humana e seguiram para o palácio. A princesa mais jovem, não tendo achado a sua roupa, ficou desesperada e começou a gritar, prometendo uma recompensa a quem restituísse o seu vestido.
Nesse momento surgiu o príncipe, que lhe entregou a roupa e disse:
— Protege-me, princesa, contra teu pai, que me quer matar.
— Cumprirei minha promessa, respondeu a princesa. Quando estiveres em perigo, grita por meu nome, que é Branca Flor.
A rainha, mãe de Branca Flor, era feiticeira, por isso as princesas tinham nascido com poderes mágicos.
O príncipe voltou então à presença do rei e declarou que faria tudo para conseguir a mão da princesa, que lhe fora prometida. O rei fechou a cara e disse o seguinte:
— Se quiseres casar com minha filha, hás de fazer primeiro o que te vou ordenar. Vês aquele campo em frente do palácio? Pois bem: ordeno-te que, de hoje até amanhã, vás semeá-lo de trigo; que do trigo faças farinha; que da farinha faças cem pães para serem postos na minha mesa.
Retirou-se o príncipe muito preocupado. Como poderia cumprir a ordem do rei? No caminho, encontrou Branca Flor que lhe disse para ficar tranqüilo, pois, no dia seguinte, tudo estaria pronto.
Realmente, na manhã seguinte, quando o rei foi ver o trabalho do príncipe, ficou maravilhado. Mas não ficou satisfeito e disse para o rapaz:
— Já que tens tanto poder, quero que tragas para junto do palácio aquelas grandes pedreiras, que se avistam lá ao longe.
O príncipe afastou-se muito triste, mas logo encontrou Branca Flor que o acalmou, dizendo que faria tudo aquilo durante a noite.
No dia seguinte, o rei ficou admirado quando viu o palácio rodeado de pedreiras. Mas mesmo assim, não ficou satisfeito e ordenou ao píncipe:
— Desejo agora que tragas o mar para perto do meu palácio.
Como das outras vezes, Branca Flor apareceu e ajudou o rapaz a cumprir a ordem do rei. E no dia seguinte, lá estava o mar, com as suas ondas, pertinho do palácio.
O rei percebeu então que tudo tinha sido feito por Branca Flor. Por isso, resolveu matá-la juntamente com o príncipe. Mas a moça adivinhou a intenção de seu pai e resolveu fugir com o rapaz.
À noite, dirigiu-se para o quarto do príncipe, avisouo do que ia acontecer e ordenou-lhe que fosse à estrebaria real e selasse os cavalos que corriam tanto quanto o vento. Quando batesse meia-noite, eles fugiriam do palácio. Assim fez o príncipe. Na hora combinada, os dois partiram a toda disparada.
Quando amanheceu o dia, o rei deu por falta do rapaz e da filha e ficou fu.ioso. Mandou selar o cavalo que voava como o pensamento e saiu, à toda, para pegar os fugitivos.
Pouco depois, os avistou. Mas Branca Flor, graças ao seu poder mágico, transformou os cavalos num mar, os arreios num barco, o príncipe num barqueiro e ela própria numa tainha.
Chegou o rei e, vendo que nada podia fazer, voltou para o palácio e contou tudo à rainha. Esta ficou louca de raiva, montou a cavalo e partiu, a toda pressa, em perseguição dos fugitivos. Mas encontrou ainda tudo no mesmo lugar. Branca Flor tinha adivinhado a vinda da rainha, de modo que não voltou à forma humana.
A rainha ficou furiosa ao ver que não podia continuar sua viagem por causa do mar. Regressou ao palácio, mas antes, apelou para seus pod res de feiticeira e rogou uma praga a fim de que o príncipe fosse ingrato para sua filha e a desprezasse.
Assim aconteceu, tempos depois. O príncipe ficou noivo de Branca Flor e foi residir, em sua companhia, num belo palácio, /las, antes do casamento, separou-se dela e esqueceu-a completamente.
Um ano depois, o príncipe contratou casamento com outra princesa. Chegou, finalmente, o dia da cerimônia da boda, seguida de muitas festas e de um grande banquete.
Na ocasião do banquete, estavam todos jantando, quando, ao partirem o bolo do casamento, saíram do seu interior um pombo e uma pomba, que foram banhar-se num vaso cheio dágua, colocado no centro da mesa. Depois, pousaram nos ombros do príncipe, arrulhando docemente, até que a pomba perguntou ao pombo:
— Não te lembras de quando meu pai te quis matar, e tu escondeste a minha roupa no lago e eu te prometi livrar de todo o perigo que te ameaçava?
E o pombo respondeu:
— Não me lembro, não me lembro! Voltou a pomba a perguntar:
- Não te lembras de quando meu pai mandou que semeasses um campo de trigo e o colhesses, e com o trigo fizesses farinha e com a farinha fizesses pão; e eu te salvei, fazendo tudo aquilo?
— Não me lembro, não me lembro! respondeu o pombo.
— Não te lembras de que meu pai te ordenou que trouxesses, primeiro umas grandes pedreiras e depois o mar, para junto do palácio, e eu fiz tudo isso, para te salvar?
Nisto, respondeu o pombo:
— Parece que me estou lembrando… Sim, sim, tenho uma vaga idéia…
E a pomba perguntou com mais firmeza: • — Não te lembras de que meu pai nos queria matar e fugimos à meia-noite, nos cavalos que corriam como o vento ?
— Estou-me lembrando… respondeu o pombo.
— Não te lembras, continuou a pomba, de que meu pai correu atrás de nós e os cavalos viraram num mar, os arreios num barco, tu num barqueiro e eu, numa tainha?
— Agora, sim, já me lembro, já me lembro! exclamou o pombo.
Enquanto os pombos conversavam, o príncipe ia também se lembrando de tudo quanto se havia passado entre ele e Branca Flor. Num certo momento, ergueu-se da cadeira e exclamou:
— Agora, eu também me lembro! Se ainda existe aquela que tantas vezes salvou a minha vida, apareça, pois é só a ela que amo!
Nesse instante, os pombos fugiram e apareceu Branca Flor, lindíssima, com um vestido de seda azul, coberto de diamantes. Tendo na mão uma coroa real, disse ao príncipe:
— Põe esta coroa de rei, porque meu pai, minha mãe e minhas irmãs já morreram e tu serás, daqui por diante, meu esposo e meu senhor.


O contrato de casamento com a outra princesa foi desfeito. E o novo rei, alegre e feliz, casou com a sua protetora.


Conto de Fada Português. Fonte : Contos Maravilhosos – Theobaldo Miranda Santos, Cia Ed. Nacional

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segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

A lenda do Negro d`água




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O negro d’água faz parte da vida de todos os pescadores do Centro Oeste. Crendo ou não crendo, todos eles já experimentaram um sustozinho,. certa vez que um boto apareceu com a sua cabeça de porco a soprar bem pertinho de onde estava a sua vara de anzol.H Em certa pescaria no curso baixo do rio Vermelho, uma vez, acompanhou-nos um "chauffer" chamado João, de sobressalência, para ajudar-nos a remendar câmara de ar no caminho, ou consertar as avarias dos pontilhões. Sempre ia por conta de serviços prováveis, sem pagar a contribuição para a cobertura das despesas. Era, pois, um companheiro para tudo.
Uma noite, quando já estávamos em boas redes, contando anedotas uns para os outros, e esperando chegar os últimos companheiros que subiram e desceram o rio, para dormirmos sossegados, escutamos um ruído do lado do rio, como se animal espantado tivesse corrido para nosso lado, derrubando mato. Era o João. Chegou sem poder falar, e horrorizado com o que vira naquele poço escuro que fica na curva do rio. Todos nos levantamos para socorrê-lo.
Que foi isso rapaz, perguntamos a um só tempo. Foi o negro d’água que brotou mesmo em baixo do meu pesqueiro, fazendo um rebojo e um barulhão, antes de erguer a metade do corpo fora d’água. E dizendo isto olhava para todos os lados, assombrado.
Você viu negro d’água coisa nenhuma, o que você viu foi um boto, que nós também vimos hoje à tarde, na curva do poço da piratinga. Os bolos do Araguaia sobem até aqui e gostam de se mostrar para os pescadores. E para provar que era isso mesmo, o nosso comparsa se meteu pelo caminho do poço indicado. Meia hora depois voltou confirmando que era boto mesmo, e se quiséssemos ver iríamos todos apreciar as evoluções que eles fazem quando vêem o homem.
Alguém "pediu a palavra" para contar um caso que havia acontecido há tempos, e dava o seu testemunho de homem de fé, qualidade que ninguém lhe negava. Todos aproximaram-se para ouvir a narrativa. Tratava-se do Tenente Pacheco, um excelente companheiro de pescaria e de caçada, profundo conhecedor daquela região e também do Estado todo.
— Uma noite, começou o oficial, estávamos pescando no rio Tapirapés, tributário do Araguaia, muito piscoso e com excelente caça; por essa razão preferido para as excursões dos que vão à Ilha, quando se formou, em baixo do nosso pesqueiro, um enorme rebôjo. Logo a seguir algo emergiu espadanando água, e fazendo um estranho barulho. Julguei que se tratasse de enorme sucuri, e pus de jeito minha espingarda de caça. Há, naquela região, muitas lagoas que são viveiros de sucuris. São elas que formam a cabeceira do rio. Não atirei no rumo; nunca fiz isso. Meti a lanterna elétrica em cima do rebôjo e avistei uma cara horrorosa, meio macaco, meio homem, cabelos lisos e bem pretos, cobrindo todo o rosto.
Os dentes eram alvos e pontiagudos, rindo para mim com ar de mofa. Os olhos, refulgindo pelo efeito da luz do farolete, eram duas tochas acesas. Nunca mais vi coisa igual. O índio Carajá que estava comigo já havia corrido espavorido. Gritou em português que não atirasse nele que ganharia maldição para o resto da minha vida.
Quando o bicho mergulhou, aproveitamos para dar o fora, e o índio pediu que fossemos embora, a seguir, porque não haveria mais um único peixe para nós. Este, é o sapo grande, que governa o rio e aparece para quem fala mal do Araguaia. Não fizemos objeção e até hoje nos recordamos daqueles olhos que pareciam farol de automóvel aumentados pela luz da lanterna.
Cada um, então, contou um caso de negro d’água e João nunca mais quis saber de participar de nossas pescarias, apesar de convidado com insistência, porque no pior servia para ajudar a empurrar o fordinho e remendar câmaras de ar.

Iamuricumás - As Mulheres sem o Seio Direito




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Em meio a uma grande festa, os índios haviam concluído a cerimônia de furar as orelhas de seus meninos, após a qual as crianças permanecem de resguardo. Segundo o costume, os homens da tribo foram à pesca para bem alimentá-las, enquanto as mulheres prosseguiram com o corte dos cabelos. Percebendo que os pais demoravam a chegar, o filho pajé decidiu ir ao rio, onde pôde observa-los batendo o timbó e pegando muitos peixes. Repentinamente, como por encanto, os índios transformaram-se em animais selvagens. Assustado o menino correu à tribo, relatando à sua mãe o que sucedera. Esta avisou as outras mulheres e, reunidas, preparavam-se para fugir dentro de poucos dias, pois os homens da pescaria agora representavam perigo! Pintaram-se e ornamentaram o corpo como se fossem homens.
Em seguida a esposa do pajé, à frente do grupo, entoou um canto, conduzindo-o até a floresta. Lá, untaram-se de veneno transformando-se no espírito Mamaé. Após cantarem e dançarem dois dias sem cessar, pediram a um velho que, pousando sobre as costas a casca de um tatu, seguisse à sua frente, abrindo-lhes passagem. O homem passou a agir como se fosse o próprio animal. As
mulheres, indiferentes aos homens da pescaria, seguiram o seu caminho, a cantar e a dançar, levando consigo mulheres de mais duas aldeias. Suas crianças foram lançadas ao rio, tornando-se peixes. Ainda hoje, as Iamuricumás viajam dia e noite, armadas de arco e flecha. Não possuem o seio direito, para melhor manejá-los. E assim, cantando e dançando, continuam a abrir caminhos pela floresta, seguindo eternamente o homem tatu.
Lenda indígena. Brasil.

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

A fonte do saqué


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Há muitos e muitos anos, no tempo em que a imperatriz Gensho reinava no Japão, morava em Mino, actual Gifu, um lavrador de poucos recursos. Apesar de ser um rapaz muito trabalhador, o que produzia em sua horta não era o suficiente para o sustento dele e de seu velho pai.
O pai também sempre foi pobre e, na idade avançada, pouco podia fazer para ajudar o filho na roça. O filho tratava o pai com carinho, sabia quanto ele tinha se sacrificado pela família. Sempre sonhava com uma maneira de dar algum conforto ao seu pai nos últimos anos de sua vida. O velho gostava muito de saquê (vinho de arroz), porém quase nunca sobrava dinheiro para o moço comprar-lhe uma garrafa.
Certa ocasião, após terminar seus trabalhos na horta de verduras, o rapaz subiu a montanha para cortar lenha. Como fazia de tempos em tempos, levaria a lenha para vender na cidade e conseguir algum dinheiro para comprar saquê para seu velho pai. Seu prazer era ver a cara de felicidade quando seu pai sorvia apetitosamente os goles de saquê.
O moço encheu o carregador de lenhas, colocou-o nas costas e começou a descer a montanha em direcção à cidade. Mas, como havia colocado muita lenha nas costas, veio cambaleando, devido ao grande peso, e acabou escorregando. Rolou morro abaixo até o fundo de um vale, onde ficou desmaiado durante horas.
Mais tarde, despertou todo dolorido e com muita sede. Nisso prestou atenção, pois ouvia o barulho de uma queda d’água. Saiu em direcção ao som e encontrou uma pequena fonte entre rochas e folhagens. Fazendo das mãos uma concha, bebeu a água da fonte e teve uma grande surpresa. Não era água e sim saquê!
Não acreditando no que estava acontecendo, tornou a beber. Realmente era saquê!
Imediatamente, o moço lembrou de seu pai e de quanta alegria ele teria saboreando aquele saquê. Então, encheu de saquê a cabaça, que sempre carregava na cintura para levar água ao seu trabalho.
Quando chegou em casa, seu velho pai estava preocupado com a demora.
– Aconteceu alguma coisa para você demorar tanto a voltar?
– É difícil de acreditar no que houve. Beba um pouco desse líquido enquanto eu conto o que aconteceu.
O pai experimentou o líquido da cabaça e comentou, feliz:
– Esse não é o saquê que você costuma comprar para mim. É muito mais gostoso!
Então, o filho revelou o acontecido no vale em seus mínimos detalhes. O pai, surpreso pela narrativa, comentou:
– Isso é uma graça divina. O deus do saquê agraciou você por ser um bom e dedicado filho. Vamos fazer a oferenda de uma taça de saquê no santuário e rezar a ele em agradecimento.
A partir desse dia, todas as tardes, quando o moço terminava seu trabalho na lavoura, ia buscar saquê na fonte. Voltava com a cabaça cheia para casa e fazia a alegria de seu pai, que o esperava ansiosamente. Assim, pai e filho viveram por muitos anos em perfeita harmonia.
A notícia daquele insólito acontecimento espalhou-se por todo o Japão e chegou aos ouvidos da imperatriz Gensho, que reinou de 715 a 724. Ela resolveu ir pessoalmente conhecer a fonte milagrosa de saquê. Ao experimentar a água da fonte, percebeu que se tratava simplesmente de água e nada mais. Conhecedora da história, ela entendeu que o milagre ocorria somente com aqueles pai e filho. Como o filho era dedicadíssimo ao pai, o deus do saquê fazia com que o pai sentisse o gosto de um delicioso saquê, sempre que bebia aquela água. Então, a imperatriz determinou que fosse construído um jardim em torno da fonte e a baptizou com o nome de Yorô, que significa “tratar bem de idosos”.
Assim, a imperatriz deu vários presentes ao moço, por tratar o pai com muito carinho. Desde então, nasceu o costume ainda vigente de a Casa Imperial Japonesa premiar as pessoas que tratam os idosos com respeito e carinho. E a Cachoeira Yorô é, ainda hoje, um ponto turístico muito visitado no Japão.

Lenda do Japão
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A árvore de Natal na casa de Cristo




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HAVIA num porão uma criança, um garotinho de seis anos de idade, ou menos ainda. Esse garotinho despertou certa manhã no porão úmido e frio. Tiritava, envolto nos seus pobres andrajos. Seu hálito formava, ao se exalar, uma espécie de vapor branco, e ele, sentado nnum canto em cima de um baú, por desfastio, ocupava-se em soprar esse vapor da boca, pelo prazer de o ver se evolar. Mas gostaria bem de comer alguma coisa. Diversas vezes, durante a manhã, tinha se aproximado do catre, onde num colchão de palha, chato como um pastelão, um saco sob a cabeça a guisa de almofada, jazia a mãe enferma. Como se encontrava ela nesse lugar? Provavelmente tinha vindo de outra cidade e subitamente caíra doente. A patroa que alugava o porão tinha sido presa na antevéspera pela polícia; os locatários tinham se dispersado para se aproveitarem também da festa, e o único tapeceiro que tinha ficado, cozinhava a bebedeira há dois dias: esse nem mesmo tinha esperado pela festa, No outro canto do quarto gemia uma velha octogenária, reumática, que tinha sido outrora babá, e que morria agora sozinha, soltando suspiros, queixas e imprecações contra o garoto, de maneira que ele tinha medo de se aproximar da velha. No corredor, ele tinha encontrado alguma coisa para beber, mas nem a menor migalha, e mais de dez vezes já tinha ido para junto da mãe para despertá-la. Por fim, a obscuridade lhe causou uma espécie de angústia: há muito tempo tinha caído a noite e ninguém acendia o fogo. Tendo apalapado o rosto de sua mãe, admirou-se muito: ela não se mexia mais e estava tão fria como as paredes. "Faz muito frio aqui", refletia ele, com a mão pousada inconscientemente no ombro da morta; depois, ao cabo de um instante, soprou os dedos para os esquentar, pegou o seu gorrinho abandonado no leito, e, sem fazer ruído, saiu do cômodo, tateando. Por vontade dele, teria saído mais cedo, se não tivesse medo de encontrar, no alto da escada, um canzarrão que latira o dia todo, na soleira das casas vizinhas. Mas o cão não se encontrava ali e já o menino ganhava a rua.
Senhor! que grande cidade! Nunca tinha visto nada parecido. De lá, de onde vinha, era tão negra a noite! Uma única lanterna para iluminar toda a rua. As casinhas de madeira são baixas e fechadas por detrás dos postigos; desde o cair da noite , não se encontrava mais ninguém fora, toda a gente permanece bem enfurnada em casa, e só os cães, as centenas e aos milhares, uivam, latem, durante a noite. Mas, em compensação, lá era tão quente; davam-lhe de comer... ao passo que aqui... Meu Deus! se ele ao menos tivesse alguma coisa para comer! E que desordem, que grande algazarra aqui, que claridade, quanta gente, cavalos, carruagens... e o frio! O nevoeiro gela em filamentos nas ventas dos cavalos que galopam; através da neve friável o ferro dos cascos tine contra a calçada: toda a gente se apressa e se acotovela e, meu Deus! como gostaria de comer qualquer coisa, e como de repente seus dedinhos lhe doem! Um agente de polícia passa ao lado da criança e se volta, para fingir que não a vê.
Eis uma rua ainda: como é larga! Esmagá-lo-ão ali, seguramente, como todo o mundo grita, vai, vem e corre, e como está claro, como é claro! Que é aquilo ali? Oh! a grande vidraça e atrás dessa vidraça um quarto, com uma árvore dentro que sobe até o teto; é um pinheiro, uma árvore de Natal onde há muitas luzes, muitos objetos pequenos, frutas douradas, e em torno bonecas e cavalinhos. No quarto há crianças que correm; estão bem vestidas e muito limpas, riem e brincam, comem e bebem algumas coisa. Eis ali uma menina que se pôs a dançar com um rapazinho. Que bonita menina! Ouve-se música através da vidraça. A criança olha surpreendida; logo sorrí, enquanto os dedos de seus pobres pezinhos doem e os das mãos se tornaram tão roxos, que não podem mais se dobrar nem mesmo se mover. D e repente o menino se lembrou que seus dedos doem muito; põe-se a chorar, corre para mais longe e eis que através de uma vidraça a vista ainda um quarto, neste, outra árvore ainda, mas sobre as mesas há bolos de todas as qualidade, bolos de amêndoa, vermelhos, amarelos, e eis que sentadas quatro formosas damas que distribuem bolos a todos que se apresentem. A cada instante, a porta se abre para um senhor que entra. N a ponta dos pés, o menino se aproximou, abriu a porta e bruscamente entrou. Hu! com que gritos e gestos o repeliram! Uma senhora se aproximou logo, meteu-lhe furtivamente um tostão na mão, abrindo-lhe ela mesma a porta da rua. Como ele teve medo! Mas o tostão rolou pelos degraus com um tilintar sonoro: ele não tinha podido fechar os dedinhos para segurá-lo. O menino apertou o passo para ir mais longe - nem ele mesmo sabe aonde. Tem vontade de chorar; mas desta vez tem emdo e corre. Corre soprando os dedos. Uma angústia o domina, por se sentir tão só e abandonado, quando de repente: Senhor! Que poderá ser ainda? Uma multidão que se detém, que olha com curiosidade. Em uma janela, atrás da vidraça, há três grandes bonecas com vestidos vermelhos e verdes e que parecem vivas! Um velho sentado parece tocar violino, dois outros estão empé junto dele, e tocam violinos menores, e todos meneiam em cadência as delicadas cabeças, olham uns para os outros, enquanto seus lábios se mexem; flama, devem falar - de verdade - e se não se ouve nada é por causa da vidraç. O meninojulgou, a princípio que eram pessoas vivas, e, quando finalmente compreendeu que eram bonecas, pôs-se de súbito a rir. N unca tinha visto bocecas assim, nem mesmo suspeitava que existissem assim! Certamente, desejaria chorar, mas é tão cômico, tão engraçado ver essas bonecas! De repente pareceu-lhe que alguém o puxava por trás. Um moleque grande, malvado, que estava ao lado del,deu-lhe de repernte um tpa na cabeça, derrubou o seu gorrinho e passou-lhe uma rasteira. O menino rolou pelo chão, algumas pessoas se puseram a gritar: aterrorizado, ele se levantou para fugir depressa e correu com quantas pernas tinha, sem saber para onde. Atravessou o portão de uma cocheira, penetrou num pátio e sentou-se atrás de um monte de lenha: "Aqui, pelo menos, reflete ele, não me acharão: está muito escurro".

Sentou-se e se ncolheu, sem poder etomar fôlego, de tanto medo, e bruscramente, pois foi muito rápido, sentiu um grande bem-estar, as mãos e pés tinham-lhe deixado de doer, e sntia calor, muito calor, como ao pé de um fogão. Subitamente se mexeu: um pouco mais e ia dormir! Como seria bom dormir nesse lugar! "Mais um instante e irei ver outra vez as bonecas", pensou o menino, que sorriu a sua lembrança: "podia jurar que eram vivas!"... E de repente pareceu-lhe que sua mãe lhe cantava uma canção. "mamãe, vou dormir; ah! como é bom dormir aqui!"

- Vem comigo, vamos ver a árvore de Natal, meu menino - murmurou repentinamente uma voz cheia de doçura.

Ele pensava que era ainda a mamãe, mas não, não era ela. Quem, então, acabava de o chamar? Não vê quem, mas alguém está inclinado sobre ele e o abraça no escuro; estendeu-lhe os braços e... e logo...: - Que claridade! A maravilhosa árvore de Natal! E agora não é um pinheiro, nunca tinha visto árvores semelhantes! Onde se encontra então nesse momento? Tudo brilha, tudo resplandece, e em torno, por toda a parte, bonecas - mas não, são meninos e meninas, só que muito luminosos! Todos o cercam, como nas brincadeiras de roda, abraçam-no em seu vôo, tomam-no, levam-no com eles, e ele mesmo voa e vê: distingue sua mã e lhe sorri com ar feliz.

- Mamãe! Mamãe! Como é bom aqui, mamãe! - exclama a criança. De novo abraça seus companheirinhos, e gostaria de lhes contar bem epressa a histórias das bonecas atrás da vidraça... - Quem são vocês então, meninos? E vocês meninas, quem são? - pergunta ele sorrindo-lhes e mandando-lhes beijos.

- Isto... é a árvore de Natal do Cristo - respondem-lhe.

- Todos os anos, neste dia, há, na casa de Cristo, uma árvore de Natal, para os meninos que não tiveram sua árvore na terra...

E soube assim que todos esses meninos e meninas tinham sido outrora crianças como ele, mas alguns tinham morrido, gelado nos cestos, onde tinham sido abandonados nos degraus das escadas dos palácios de Petersburgo; outros tinham morrido, junto as amas de algum dispensário finlandês; uns dobre o seio exaurido de suas mães, no tempo em que grassava, cruel, a fome na Samara; outros ainda, sufocados pelo ar mefítico de um vagão de terceira classe. Mas todos estão aqui neste momento, todos são agora como anjos, todos junto ao Cristo, e Ele, no meio das crianças, estende as mãos para os abençoar e as pobres mães... E as mãe dessas crianças estão ali, todas, num lugar separado, e choram; cada uma reconhece seu filhinho ou filhinha que acorrem voando para elas, abraçam-nas, e com suas mãozinhas enxugam-lhes as lágrimas, recomendando-lhes que não chorem amsi, que eles estão muito bem aqui...

E nesse lugar, pela manhã, os porteiros descobriaram o cadaverzinho de uma criança gelada junto de um monte de lenha. Procurou-se a mãe... Estava morta um pouco adiante; os dois se encontraram no céu, junto ao bom Deus.

Dostoievski, Fedror Mikhailovitch, 1821-1881. Contos de Dostoievski / introdução, seleção e tradução de Ruth Guimarães. - - 2. ed. -- São Paulo : Cultrix, 1985. pp 127 - 130.

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A pequena vendedora de fósforos




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Fazia um frio terrível; caía a neve e estava quase escuro; a noite descia: a última noite do ano.
Em meio ao frio e à escuridão uma pobre menininha, de pés no chão e cabeça descoberta, caminhava pelas ruas.
Quando saiu de casa trazia chinelos; mas de nada adiantavam, eram chinelos tão grandes para seus pequenos pézinhos, eram os antigos chinelos de sua mãe.
A menininha os perdera quando escorregara na estrada, onde duas carruagens passaram terrivelmente depressa, sacolejando.
Um dos chinelos não mais foi encontrado, e um menino se apoderara do outro e fugira correndo.
Depois disso a menininha caminhou de pés nus - já vermelhos e roxos de frio.
Dentro de um velho avental carregava alguns fósforos, e um feixinho deles na mão.
Ninguém lhe comprara nenhum naquele dia, e ela não ganhara sequer um níquel.
Tremendo de frio e fome, lá ia quase de rastos a pobre menina, verdadeira imagem da miséria!
Os flocos de neve lhe cobriam os longos cabelos, que lhe caíam sobre o pescoço em lindos cachos; mas agora ela não pensava nisso.
Luzes brilhavam em todas as janelas, e enchia o ar um delicioso cheiro de ganso assado, pois era véspera de Ano-Novo.
Sim: nisso ela pensava!
Numa esquina formada por duas casas, uma das quais avançava mais que a outra, a menininha ficou sentada; levantara os pés, mas sentia um frio ainda maior.
Não ousava voltar para casa sem vender sequer um fósforo e, portanto sem levar um único tostão.
O pai naturalmente a espancaria e, além disso, em casa fazia frio, pois nada tinham como abrigo, exceto um telhado onde o vento assobiava através das frinchas maiores, tapadas com palha e trapos.
Suas mãozinhas estavam duras de frio.
Ah! bem que um fósforo lhe faria bem, se ela pudesse tirar só um do embrulho, riscá-lo na parede e aquecer as mãos à sua luz!
Tirou um: trec! O fósforo lançou faíscas, acendeu-se.
Era uma cálida chama luminosa; parecia uma vela pequenina quando ela o abrigou na mão em concha...
Que luz maravilhosa!
Com aquela chama acesa a menininha imaginava que estava sentada diante de um grande fogão polido, com lustrosa base de cobre, assim como a coifa.
Como o fogo ardia! Como era confortável!
Mas a pequenina chama se apagou, o fogão desapareceu, e ficaram-lhe na mão apenas os restos do fósforo queimado.
Riscou um segundo fósforo.
Ele ardeu, e quando a sua luz caiu em cheio na parede ela se tornou transparente como um véu de gaze, e a menininha pôde enxergar a sala do outro lado. Na mesa se estendia uma toalha branca como a neve e sobre ela havia um brilhante serviço de jantar. O ganso assado fumegava maravilhosamente, recheado de maçãs e ameixas pretas. Ainda mais maravilhoso era ver o ganso saltar da travessa e sair bamboleando em sua direção, com a faca e o garfo espetados no peito!
Então o fósforo se apagou, deixando à sua frente apenas a parede áspera, úmida e fria.
Acendeu outro fósforo, e se viu sentada debaixo de uma linda árvore de Natal. Era maior e mais enfeitada do que a árvore que tinha visto pela porta de vidro do rico negociante. Milhares de velas ardiam nos verdes ramos, e cartões coloridos, iguais aos que se vêem nas papelarias, estavam voltados para ela. A menininha espichou a mão para os cartões, mas nisso o fósforo apagou-se. As luzes do Natal subiam mais altas. Ela as via como se fossem estrelas no céu: uma delas caiu, formando um longo rastilho de fogo.
"Alguém está morrendo", pensou a menininha, pois sua vovozinha, a única pessoa que amara e que agora estava morta, lhe dissera que quando uma estrela cala, uma alma subia para Deus.
Ela riscou outro fósforo na parede; ele se acendeu e, à sua luz, a avozinha da menina apareceu clara e luminosa, muito linda e terna.
- Vovó! - exclamou a criança.
- Oh! leva-me contigo!
Sei que desaparecerás quando o fósforo se apagar!
Dissipar-te-ás, como as cálidas chamas do fogo, a comida fumegante e a grande e maravilhosa árvore de Natal!
E rapidamente acendeu todo o feixe de fósforos, pois queria reter diante da vista sua querida vovó. E os fósforos brilhavam com tanto fulgor que iluminavam mais que a luz do dia. Sua avó nunca lhe parecera grande e tão bela. Tornou a menininha nos braços, e ambas voaram em luminosidade e alegria acima da terra, subindo cada vez mais alto para onde não havia frio nem fome nem preocupações - subindo para Deus.
Mas na esquina das duas casas, encostada na parede, ficou sentada a pobre menininha de rosadas faces e boca sorridente, que a morte enregelara na derradeira noite do ano velho.
O sol do novo ano se levantou sobre um pequeno cadáver.
A criança lá ficou, paralisada, um feixe inteiro de fósforos queimados. - Queria aquecer-se - diziam os passantes.
Porém, ninguém imaginava como era belo o que estavam vendo, nem a glória para onde ela se fora com a avó e a felicidade que sentia no dia do Ano¬Novo.

Conto de Hans Christian Andersen.
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