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HOJE ALGUMAS FRASES ME DEFINEM: Clarice Lispector "Os contos de fadas são assim. Uma manhã, a gente acorda. E diz: "Era só um conto de fadas"... Mas no fundo, não estamos sorrindo. Sabemos muito bem que os contos de fadas são a única verdade da vida." Antoine de Saint-Exupéry. Contando Histórias e restaurando Almas."Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos." Fernando Pessoa

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terça-feira, 19 de outubro de 2010

O velho Querecas


ERA uma moça solteira e muito animosa que ficou órfã de pai e mãe e sem ter onde se abrigar. Na cidade havia uma casa abandonada porque apareciam almas do outro mundo e ninguém queria lá ficar uma noite. A moça lá foi ter e arranjou as coisas para dormir. Perto da meia-noite ouviu um barulho no forro do quarto, gemidos e uma voz gritando: eu caio! eu caio! eu caio!
— Pois cai logo, disse a moça. Caiu uma perna e o barulho começou a ouvir-se mais forte o a voz gritando: eu caio! eu caio! eu caio!
— Pois caia quem já caiu, dizia a moça. Caiu outra perna e assim, com muito barulho, gemidos e gritos de eu caio, eu caio, foram caindo braços, peito, mãos, cabeça, até que tudo ficou no assoalho e se juntou, levantando-se um homem careca, já velho, muito simpático.
— És a única pessoa no mundo que não teve medo de mim e ajudou-me a desencantar. Ainda falta muito mas quero agradecer-te. Aqui tens uma bolsa que sempre estará cheia de moedas por mais que gastes.
Desapareceu o velho e a casa ficou sem barulho algum, muito sossegada. A moça ficou vivendo muito bem, tratando-se do melhor, sem que vissevivalma. Lá uma vez por outra ouvia uma voz que lhe perguntava:
— Falta-lhe alguma coisa?
— Nada me falta, respondia a moça — quem me fala?
— E’ o velho Querecas! dizia a voz.
A moça começou a reparar que a cama amanhecia como se dormissem nela duas pessoas. Resolveu verificar e fingiu adormecer. No escuro .sentiu que uma pessoa entrava no quarto, despia-se e se metia na cama, adormecendo. Ouvindo o ressonar, a moça fez lume para ver quem era, lem-hrando-se do velho Querecas, dono da casa. Viu um moço muito bonito e forte, dormindo calmamente. A moça ficou tão embevecida em contemplá-lo que um pingo de cera da vela caiu em cima do rosto do rapaz e acordou-o.
— Ah! ingrata! Dobraste-me o encanto que estava quási a terminar. Agora para me achares, sapatos de ferro hás-ãe gastar…
Desapareceu o rapaz e a moça ficou muito desconsolada pelo castigo da sua curiosidade. Mandou fazer uns sapatos de ferro, calçou-os e pôs-se a correr mundo, procurando o paradeiro do namorado. Ninguém dava notícia. Os sapatos foram-se gastando e a moça cada vez mais cansada de andar e sofrer necessidades.
Uma tarde chegou a uma cidade e não encontrou hospedagem em parte alguma. Depois de muito procurar, escondeu-se num palheiro abandonado, metendo-se dentro das palhas secas para dormir. Muito tarde acordou por um sussurro de vozese conheceu que eram bruxas numa reunião. Falavam entre elas:
— Que há de novo no teu mundo?
— As mesmas cousas e as mesmos lousas! Por fim uma bruxa que viera por derradeiro disse:
— Novidade, novidade é que o príncipe desta cidade, que estava encantado, no velho Querecas, vai morrer porque ninguém o pode ver…
— E por que não o vêem?
— Porque está invisível e só será visto pelo tecido da bolsa sem fim que ele deu a uma menina que ia quebrando o encanto, mas perdeu porque era curiosa.
Conversaram muito e depois se separaram voando para todos os lados. A moça, logo que rompeu o dia, procurou a verdade e lhe ensinaram o palácio do rei. Foi perguntar pela rainha velha e esta lhe disse que o filho estava encantado num quarto do castelo, doente, mas ninguém o via por mais que procurasse ver. A moça pediu que a levassem até esse quarto, e lá chegando rasgou a bolsa que o velho Querecas lhe dera, e pela fazenda olhou, avistando o mesmo rapaz seu conhecido, deitado no chão, com os olhos fechados, parecendo muito mal. A moça deu um grito e o rapaz acordando, e reconhecendo-a, deu outro ainda maior, deseneantando-se e aparecendo aos olhos de todos. Começaram a tratá-lo com muito carinho e ele ficou bom e casou com a moça.


Conto de Fadas Português. Fonte: Os Melhores contos
Populares de Portugal de Câmara Cascudo

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